A classificação de lesões cariosas é um tema recorrente na prática odontológica, especialmente entre os profissionais que atuam com procedimentos restauradores.
Mesmo sendo um conhecimento tradicional, é fundamental revisitá-lo com uma perspectiva atualizada, considerando os avanços na odontologia restauradora e adesiva.
Compreender as bases dessa classificação não apenas reforça o raciocínio clínico, mas também amplia a capacidade do profissional em individualizar o tratamento de acordo com a localização e o comportamento da lesão.
Trata-se de um referencial técnico que, mesmo com suas limitações, permanece relevante por facilitar o diagnóstico, o planejamento e a execução das intervenções restauradoras.
Se você é um cirurgião-dentista que busca embasamento teórico sólido e aplicações práticas eficientes, entender profundamente a Classificação de Black é essencial para aprimorar sua atuação.
Neste artigo, vamos explorar em detalhes cada uma das classes, suas indicações, limitações e aplicações na prática contemporânea.

O que é a Classificação de Black?
Proposta pelo Dr. Greene Vardiman Black, a classificação foi desenvolvida no final do século XIX como uma metodologia estruturada para categorizar cavidades resultantes de lesões cariosas.
O sistema considera, primordialmente, a localização anatômica da cárie no dente, orientando o cirurgião-dentista na elaboração de preparos cavitários específicos e na escolha dos materiais restauradores mais adequados.
Essa abordagem teve grande impacto no desenvolvimento da Dentística Operatória moderna, contribuindo para a sistematização do raciocínio clínico e para a uniformização das condutas restauradoras.
Embora novas abordagens tenham surgido com o advento da odontologia adesiva e das técnicas minimamente invasivas, o modelo proposto por Black ainda ocupa um papel de destaque no ensino acadêmico, nos registros clínicos e na comunicação entre profissionais.
Sua longevidade se deve à simplicidade, aplicabilidade prática e valor como ponto de partida para decisões clínicas fundamentadas.

O que é a classificação etiológica?
Diferentemente da classificação de Black, que foca na topografia da lesão, a classificação etiológica tem como principal objetivo identificar os fatores causais envolvidos na perda de estrutura dentária.
Essa abordagem considera uma variedade de agentes etiológicos, como cárie de origem bacteriana, erosão causada por ácidos alimentares ou gástricos, abrasão decorrente de hábitos parafuncionais ou escovação agressiva, e abfração associada a sobrecarga oclusal.
A análise etiológica é indispensável para uma abordagem clínica abrangente, pois orienta não apenas a intervenção restauradora, mas também medidas preventivas e educativas que visam o controle do agente causador.
Compreender a etiologia permite ao cirurgião-dentista traçar estratégias personalizadas de tratamento, favorecendo o prognóstico a longo prazo e minimizando a recorrência das lesões.
Essa classificação se integra ao raciocínio clínico contemporâneo, promovendo uma odontologia centrada na causa e não apenas na consequência da patologia.

Estrutura da Classificação de Black
Classe I
Lesões localizadas nas fóssulas e fissuras das superfícies oclusais de molares e pré-molares, assim como na superfície palatina de incisivos superiores.
São áreas com alto risco de acúmulo de biofilme, exigindo intervenção precoce.
Classe II
Envolvem as superfícies proximais de pré-molares e molares.
Por estarem em regiões de difícil acesso, essas lesões exigem técnica apurada para garantir o selamento marginal e o contato proximal adequado.
Classe III
Afetam as superfícies proximais de incisivos e caninos, sem comprometimento do ângulo incisal.
Nessa classe, a estética é um fator determinante na escolha do material restaurador, especialmente quando se utilizam resinas compostas.
Classe IV
Lesões que envolvem as superfícies proximais de incisivos e caninos, com envolvimento do ângulo incisal.
Exigem maior atenção ao contorno anatômico e translucidez do material restaurador, visando resultados estéticos superiores.
Classe V
Afetam o terço cervical das faces vestibulares ou linguais de qualquer dente.
Estão frequentemente associadas a fatores como abrasão, erosão ou retração gengival, exigindo uma abordagem multidisciplinar.
Classe VI
Incluída posteriormente à proposta original de Black, abrange lesões nas pontas de cúspides ou bordas incisais.
Embora menos comuns, essas lesões podem comprometer significativamente a função mastigatória.

Quais os critérios de classificação?
Os principais critérios que orientam a classificação das lesões cavitárias, especialmente quando se utiliza o sistema proposto por Black, são:
- Localização anatômica da lesão: A posição da cavidade na estrutura dentária – seja em fóssulas, fissuras, superfícies proximais, cervicais ou bordas incisais – determina a classe atribuída e influencia diretamente na abordagem clínica.
- Grau de envolvimento estrutural: A extensão da destruição do tecido dentário, incluindo se há ou não comprometimento de cúspides, ângulos incisais ou estruturas adjacentes, interfere na complexidade do preparo e no prognóstico restaurador
- Tipo de dente acometido (anterior ou posterior): A anatomia dos dentes anteriores e posteriores, bem como suas funções distintas, como a estética ou a mastigação, impactam na seleção do material restaurador e na técnica operatória indicada.
- Função estética e mastigatória comprometida: A perda funcional, seja do ponto de vista oclusal ou estético, deve ser considerada no planejamento restaurador para restabelecer a harmonia oral e o conforto do paciente.
Esses critérios fornecem uma base racional para o diagnóstico, favorecendo a escolha do desenho cavitário mais adequado, o uso de técnicas conservadoras quando possível e a seleção de materiais restauradores que garantam longevidade clínica, estética satisfatória e biomecânica funcional.

Vantagens da Classificação de Black
- Didática eficiente: facilita o ensino da disciplina de Dentística, especialmente nos estágios iniciais da formação acadêmica, por oferecer uma estrutura lógica e sistematizada de categorização das cavidades. Essa abordagem contribui para que os alunos compreendam a relação entre a morfologia dental e os tipos de lesões, favorecendo o raciocínio clínico desde os primeiros atendimentos.
- Padronização: permite comunicação clara entre profissionais, tanto no ambiente clínico quanto acadêmico. A adoção universal da nomenclatura de Black garante que o diagnóstico e o planejamento restaurador sejam compreendidos por diferentes membros da equipe odontológica, reduzindo ambiguidades e promovendo maior assertividade nas condutas propostas.
- Planejamento clínico: auxilia na escolha da abordagem restauradora ao fornecer diretrizes baseadas na localização da lesão e no tipo de dente envolvido.
A classificação orienta o profissional quanto ao tipo de preparo, técnica de inserção do material e necessidade de isolamento, o que impacta diretamente na longevidade e no sucesso das restaurações. - Documentação legal e acadêmica: serve como referencial em prontuários e pesquisas científicas, favorecendo a padronização dos registros clínicos. Essa uniformidade é fundamental para fins legais, comparações estatísticas, estudos longitudinais e elaboração de protocolos clínicos baseados em evidências.

Limitações da Classificação de Black
- Não contempla etiologia da lesão: limita-se à localização anatômica, desconsiderando os fatores causais como abrasão, erosão ou abfração, que requerem estratégias terapêuticas distintas. Essa lacuna pode comprometer a individualização do tratamento e a prevenção de recorrência.
- Desatualizada frente à odontologia adesiva moderna: a proposta original de preparos extensivos com retenção mecânica não dialoga com os princípios contemporâneos da mínima intervenção e preservação tecidual, baseados na adesividade dos materiais restauradores.
- Desconsidera aspectos minimamente invasivos: a classificação não orienta quanto à remoção seletiva de tecido cariado nem à avaliação da atividade da lesão, aspectos centrais na odontologia moderna, que prioriza o respeito à biologia dental e à integridade estrutural.
- Pouco adaptada à realidade da prevenção e controle de riscos: não considera a susceptibilidade individual do paciente, a microbiota bucal ou os hábitos comportamentais, elementos cruciais no manejo clínico atual que integra prevenção, monitoramento e educação em saúde.
Apesar dessas limitações, a classificação ainda é amplamente utilizada como base didática e como ponto de partida para o planejamento restaurador inicial.
Sua simplicidade conceitual e valor histórico conferem utilidade na estruturação do raciocínio clínico, especialmente em contextos educacionais e como ferramenta complementar em conjunto com abordagens mais modernas e individualizadas.

Como a classificação é utilizada na prática?
Mesmo sendo um sistema tradicional, a classificação de Black permanece como uma ferramenta valiosa no diagnóstico, no planejamento e na execução de procedimentos restauradores, sendo constantemente adaptada à luz das práticas odontológicas contemporâneas.
- Avaliação da extensão e localização da lesão: na rotina clínica, a classificação de Black auxilia na identificação precisa da topografia da cavidade, sendo fundamental para determinar a complexidade do preparo e a melhor abordagem restauradora. Com base nessa categorização, o cirurgião-dentista consegue prever dificuldades operatórias, selecionar instrumentos adequados e estimar o tempo clínico necessário para o procedimento.
- Tomada de decisão baseada na classe da cavidade: por exemplo, lesões de Classe II em dentes posteriores exigem atenção especial ao desenho do contorno proximal, ao ponto de contato e ao embricamento funcional, evitando falhas de adaptação ou impactação alimentar. Já as lesões de Classe IV, por envolverem ângulos incisos, demandam maior destreza na reconstrução morfológica e na estratificação de resinas compostas para alcançar resultados estéticos satisfatórios e biomimeticamente integrados.
- Aplicação em técnicas minimamente invasivas: com os avanços da odontologia adesiva, os conceitos clássicos propostos por Black passaram a ser reinterpretados. O preparo cavitário, antes baseado na retenção mecânica, agora prioriza a remoção seletiva do tecido cariado, respeitando os limites biológicos e estruturais do dente. Assim, a classificação continua sendo uma referência inicial, mas é utilizada de forma integrada aos princípios de mínima intervenção e longevidade restauradora.
- Integração ao plano de tratamento global: a correta aplicação da classificação também contribui para a elaboração de um plano de tratamento mais completo e personalizado. Ela permite ao profissional comunicar-se com clareza na equipe multidisciplinar, descrever intervenções em prontuários e orientar o paciente quanto à complexidade e às etapas do tratamento restaurador.

Conclusão
A Classificação de Black permanece como um alicerce no raciocínio clínico da Dentística, sendo amplamente empregada tanto na formação acadêmica quanto na prática diária dos cirurgiões-dentistas.
Mesmo com o surgimento de abordagens restauradoras mais conservadoras e técnicas baseadas em adesão e preservação tecidual, compreender profundamente a lógica dessa classificação permite integrar tradição e inovação de maneira estratégica e segura.
Ao conhecer suas aplicações, critérios, benefícios e limitações, o profissional torna-se mais apto a realizar diagnósticos precisos, planejar intervenções de maneira personalizada e comunicar-se com clareza no contexto clínico, acadêmico e legal.
Trata-se de um conhecimento que, embora centenário, se mantém relevante quando adaptado às exigências da odontologia moderna.
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Referências:
https://saudeverso.com.br/classificacao-de-black
https://blog.suryadental.com.br/classificacao-de-black
https://www.codental.com.br/blog/classificacao-de-black-conheca-mais-sobre/
https://rbbd.febab.org.br/rbbd/article/download/1131/1098/4148
https://aditek.com.br/blog/classe-de-black
https://www.youtube.com/watch?v=RK1SW7yeiQ8
*O texto acima não foi escrito por cirurgião dentista, portanto a EAP não se responsabiliza pelas informações, uma vez que não possuem caráter científico.